sábado, 13 de fevereiro de 2010

FANTASMAS URBANOS

Um psicólogo da USP, para sua tese de mestrado, trabalhou por alguns anos como faxineiro no campus da universidade e comprovou que certos profissionais não são notados no seu dia-a-dia. Enquanto ele, o psicólogo, estava vestido e trabalhando de faxineiro, nem seus colegas o cumprimentava. No entanto, ao trocar de roupa e pegar seu material para estudar ou simplesmente andar pelo mesmo caminho dentro do campus, todos o notavam e paravam para conversar.
Essa experiência mostra o quanto nós somos ingratos e indiferentes com outros seres humanos. Muitas vezes, e não são poucas, chegamos a parar o carro para não machucar um cachorro que atravessa a rua à nossa frente. Outras vezes paramos para admirar coisas inanimadas como se fosse a mais bela do mundo. Recebemos mensagens de e-mail com paisagens lindas e ficamos estupefatos com a obra de Deus. Mas em uma calçada, quando tem um varredor de ruas limpando o nosso caminho, passamos sem ao menos olhar onde pisamos, menos ainda pedimos licença por estar atrapalhando o seu serviço. Já vi casos em que pessoas se irritaram porque quase tiveram os seus pés varridos por um descuido do trabalhador, sendo que este estava fazendo o melhor para que os transeuntes não pisassem em lixos que eles mesmos jogaram ao chão sabendo que mais tarde teria alguém para limpar.
Qual o valor do ser humano para o próprio ser humano? Será que este valor é quantificado pelo que veste ou tem? Quem vale mais como ser humano, o que veste branco e senta em cadeira acolchoada de veludo ou o que pega em uma vassoura e nem uniforme tem para deixar a cidade dos engravatados mais bonita e isenta de focos de doenças?
A resposta para estas perguntas está na racionalidade humana. Essa racionalidade trás diferenças onde não deveria existir, por exemplo: ser o mais gordo, o mais feio, o mais ou menos qualificado, etc. Isso porque pensamos que fazemos e somos diferentes uns dos outros, o que não é racional.
Michel Montaigne  (pensador e filósofo francês, 1533 – 1592) usava os animais para identificar e condenar essa racionalidade humana. Em uma de suas muitas citações, pergunta: “alguém já viu um porco criticar outro porco por estar gordo demais, ou um cão rejeitar uma cadela por ser de raça diferente?” Só o ser humano faz tal diferenciação e se vangloria disso.
Quer seja um varredor de rua, coletor de lixo, garçom, faxineiro, zelador, diarista, manobrista, enfim, qualquer trabalhador que não notamos no nosso viver, tem valor como qualquer outro que trabalha honestamente. “A mais honrosa das ocupações é servir o público e ser útil ao maior número de pessoas. Montaigne.” Se achamos bom ser servidos, devemos aprender a servir também, só assim valorizamos o que recebemos. É o respeito para ser respeitado. É o amar para ser amado. É dar para receber.
Nada custa pedir licença e agradecer ao varredor de rua quando estamos andando nas calçadas. Falar um bom dia, dar um sorriso, parar para conversar com tais pessoas, e não me refiro só a varredores, mas a todos que não notamos sempre, faz bem e levanta o astral dessas pessoas, elas se sentem notadas e valorizadas. Elas, como todos, precisam e merecem ser notadas. Isso é amar ao próximo como a ti mesmo.

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