sábado, 5 de maio de 2012

VIDA DE CIDADE PEQUENA


Toda cidade tem uma praça que dizem ser central, mesmo não sendo no centro da cidade, principalmente quando a cidade é uma cidadezinha do interior.
Em Minas não faltam praças e nem o que fazer nessas praças. E mesmo não tendo o que fazer o simples fato de ir para a praça e ficar lá sentado já é o suficiente. Sempre tem o que ver e o que falar, porque dificilmente se vai para a praça sozinho, ou sozinha.
- Aquela lá não é a fia do “seu Jão” casada com o “Irto” da farmácia? O que ela tá fazendo aqui a essa hora sozinha?
É. quanto mais no interior, menos temos que nos preocupar com a nossa segurança. Sempre tem alguém tomando conta da gente em todos os lugares por vinte e quatro horas. Basta colocar o pé na calçada que em frente tem uma vizinha debruçada na janela para dar bom dia e perguntar se já vai sair. A vontade é de responder:
- Não, estou chegando agora!
Não adiantaria porque ela viu a que horas todos da casa chegaram. É o ofício saber de tudo e de todos. Acho que por isso jornais locais nestas cidadezinhas não vendem. Para que se todos sabem tudo de todos? Fofoca nova só da mulher que descobre que foi traída. Novo para ela, claro. Nem mesmo da mulher que traí é novidade porque sempre é motivo para contar ao marido para ver o que acontece, só para ver o circo pegar fogo. Fofoca mórbida para criar a esperança de um crime que sirva de assunto por muito tempo e entre para a cultura da cidade.
Quando aparece alguém diferente na cidade sempre tem um que se achega para perguntar se pode ajudar. Na verdade é assim:
- Oi seu moço. O senhor não é daqui. De onde o senhor é? O que o senhor veio fazer  por essas bandas? Quem é o senhor? Quem o senhor procura?
Pouco falta pedir CPF, CIC, declaração de imposto e comprovante de nada consta policial. Em alguns lugares até tem um para ligar para a delegacia e afirmar que viu uma pessoa estranha entrando em tal lugar com atitude suspeita. A polícia, por falta de ocorrências reais acaba por passar perto do estrangeiro e dirigir um olhar dos seis ocupantes do Fiat 147, pois nessas horas sempre cabe mais um, quem é o abestaiado que vai perder uma chance dessas de andar de carro? Lançam um olhar como quem diz “estamos de olho no senhor”. Se o estrangeiro não estiver inteirado desses fatos estremece dos pés à cabeça. Mas isso é coisa de interior mesmo.
Ruim para o estrangeiro quando é reconhecido pela tal da janela. Coitado.
- Cê viu quem chegô da cidade? – é assim mesmo que se referem a uma cidade maior – É o fio do cumpade Tomé que foi estudar fora. Virô um homi feito. Mas falaram que ele se envolveu numas coisas que num sei naum...
Coitado do filho do senhor Tomé! Vai ser assunto até sua partida ou dar explicações infinitas vezes. Mesmo assim haverá quem duvide dele e jurar de pés juntos que ouviu falar o que ele fez. E se perguntar quem falou, foi o Ocride que tem um primo que conhece um amigo que mora na cidade e que é primo da namorada do filho do senhor Tomé que contou para uma amiga durante a missa de domingo. Onde estava o padre e qual era o sermão ninguém sabe e ninguém viu.
Se chegar de carro novo é porque virou traficante. Chegar a pé é porque quebrou a cara e voltou. Se casar com mulher bonita a aposta é de que deu o golpe do baú. Se casar com mulher feia é porque engravidou a garota e não teve outro jeito.
Vida no interior não é fácil mesmo. Passear em paz na praça ou pelas ruas como quem não quer nada então é impossível, pois sempre tem um que quer alguma coisa. Ou melhor, quer saber aonde vai e por que. Se for respondido que simplesmente saiu para esticar as pernas é traduzido como: - fui descoberto. Não responder é pior ainda, significa que você está fugindo ou indo onde não devia escondido de alguém.
Se ficar dentro de casa fosse a solução, seria uma ótima opção. Não adianta. Irão bater à porta só para saber se você está só ou bem acompanhado. No mínimo irão perguntar se está tudo bem enquanto tentam enxergar pela fresta da porta entreaberta para terem a certeza de que não tem mais alguém lá dentro. Não há escapatória.
Muitas pessoas reclamam de morar em cidade grande porque é cada um por si e Deus por todos. No caso de precisar de ajuda fica difícil. Vizinhos não se conhecem. De fato é muito ruim mesmo. Mas não deixa de ter suas vantagens em alguns casos. Já no interior, como disse antes, você sempre é bem cuidado, porque sempre terá alguém por perto, mesmo que você não veja.
Porém, contudo, todavia, uma coisa é certa. Se alguém nessas cidadezinhas gritar socorro aparecerão dezenas de mãos prontas para ajudar. Embora que depois da ajuda surgirão comentários diversos sobre a causa do pedido de ajuda. Mas o que vale é que é um povinho unido mesmo. Fofoqueiros, mas unidos. Se morrer um, todos sentem. Se faltar um, todos se preocupam.
Não há coisa melhor que vida no interior, principalmente sábado à noite na praça. Poderia até ser tomando um sorvete, mas a sorveteria fecha cedo, antes da noite cair. Poderia ser tomando uma cervejinha, mas seria demais falar alto depois da primeira. Diriam depois que você deu escândalos. Não importa.
Bão mermo é falar da vida dos otro que passa de bobeira! Eita trem bão, sô!

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